sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O MUNDO À NOSSA VOLTA


Sim e exactamente por isso. Erick Erickson construiu a teoria do desenvolvimento psico-social dos indivíduos a partir de etapas que não são mais do que ultrapassagens das diversas crises por onde o ser humano tem de passar para crescer. De outra maneira ficaríamos sempre crianças. Talvez se possa dizer o mesmo a respeito das sociedades. Se soubermos aproveitar o momento difícil em que nos encontramos, podemos sair dele mais doridos, mas também mais amadurecidos. A crise é sempre um choque com a realidade, que nos obriga não só a parar, mas também a “reparar” (“re-parar”) quer no sentido de “prestar atenção” ao que nos está a acontecer (pensar, reflectir), quer no sentido de corrigir/reparar trajectórias de vida, refazer projectos, reconstruir futuros, tomando as decisões necessárias para seguir em frente. Neste aspecto, é uma porta aberta e uma ocasião favorável à esperança que está do outro lado da crise em busca de resposta, quando não escondida dentro da mesma crise e, neste caso, à espera que a acordem. A realidade não muda, ou só muda na medida em que mudarmos nós. E mudarmos, em primeiro lugar, a nossa concepção de vida, para depois mudarmos a nossa concepção de esperança e os caminhos para a atingir. Temos muito que resolver ao nível da vida que levámos, da esperança que a alimentou e dos caminhos percorridos. Andámos a viver na lua, confundindo sonho com vida e esperança com miragens; agora caímos na dureza da realidade. Mas atenção! Não basta mudar de vida, como pretendem alguns, no sentido de viver com menos, adaptando o seu estilo às posses económicas, nem tão pouco mudar a nossa concepção de esperança, sonhando menos e duma forma mais realista. Mais do que mudar de vida, precisamos de mudar a vida, dando-lhe novos conteúdos e enchendo-a de valores autênticos, como sublinharam alguns dos nossos bispos nas homilias do Natal, apelando à recuperação dos valores espirituais e morais na nossa vida comum. E mais do que sonhar menos esperança, precisamos de conquistá-la, buscando-a no caminho onde ela se encontra, porque acertar com a verdadeira esperança é acertar com o caminho que a ela conduz.
Há quem olhe a crise como tempo de espera, como se fosse uma onda gigantesca que nos assusta ao passar por cima de nós, mas que acabará por seguir em frente rumo à praia, para depois retomarmos a vida do costume. É querer que ela passe por nós (aguentar), quando nós é que temos de passar pela crise e sair dela com a lição aprendida, ou seja, sabendo pelo menos que temos de mudar o caminho que nos trouxe até aqui. Parece claro que outro terá de ser o rumo a dar às nossas vidas.
Chamou-me a atenção a mensagem natalícia do Cardeal Patriarca de Lisboa, ao falar da necessidade duma nova etapa da civilização em que se desse prioridade aos valores do espírito e não apenas ao dinheiro, apontando o caminho de Belém com uma pergunta no seu título: “E se o Natal nos ajudasse a enfrentar a crise?”. Pergunta provocadora às nossas vidas e convite desafiante a pormo-nos a caminho de Belém e do Presépio, ao encontro dum Deus Menino, duma família acolhedora e duma vida mais simples, mas certamente mais aquecida e humana. Talvez esteja aqui a nova etapa da civilização de que falava D. José Policarpo na sua mensagem de Natal: uma civilização assente e construída a partir de Deus, da Família e da pobreza/riqueza partilhadas. Temos muito a aprender com o Natal e o Presépio. Os magos, diz-nos Mateus, foram até lá e, oferecendo o melhor que tinham, regressaram ao seu país “por outro caminho”. É esse “outro caminho” que temos de percorrer, de regresso à nossa realidade pequena e ao nosso país pobre.
Esperança em tempo de crise? Sim, se tivermos a coragem de ir pelo caminho que traz “vida nova” para que haja “ano novo” e um virar de página nas agruras que nos esperam.

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