sexta-feira, 1 de julho de 2011

O MUNDO À NOSSA VOLTA

O MUNDO À NOSSA VOLTA
«Descansai um pouco» (Marcos 6, 31)

A. da Costa Silva, s.j.

É convite de Jesus aos seus discípulos, depois duma actividade apostólica que os encantou mas também cansou. Convite, certamente, oportuno para começos de férias, depois de um ano de trabalho mais ou menos cansativo; tempo de calor, de exposição ao Sol e de busca de sombras e brisas refrescantes.

Tempo de paragem, num mundo cansado e explorado até aos limites dos seus recursos, contaminado nas fontes, envelhecido e por vezes revoltado por lhe exigirem aquilo que não pode dar à nossa sociedade de consumo. Um mundo cansado e de pessoas cansadas que não encontram o futuro porque perderam o passado, que não encontram a esperança porque perderam a fé, e, por isso, vagueiam desorientadas no presente. Quais náufragos, agarram-se a não sei quê, porque o não sei quê é a única tábua de salvação, ela mesma perdida nas ondas da vida, vagueando dum lado para o outro, sempre a fugir à esperança que a quer agarrar. O seu rumo é incerto e caprichoso, indo e vindo ao sabor das ondas, ora subindo na sua crista, ora mergulhando na onda cavada onde se esconde para aparecer novamente não se sabe onde. Enfim, um mundo cansado de pessoas cansadas onde a tábua de salvação também já desistiu de encontrar o rumo, limitando-se, abandonada, a andar dum lado para o outro, à superfície, se possível, sem sentido nem tino. Em palavras de Jesus: «Afadigadas e abatidas como ovelhas sem pastor» (Mateus 9, 36). Tempo de férias, tempo de paragem que bem pode ser aproveitado para uma reflexão serena sobre a vida pessoal e colectiva que levamos e sobre o sentido que lhe estamos a dar.

Mas tempo também para tratar das nossas sedes e fomes. «Todos vós que tendes sede, vinde beber desta água, mesmo os que não têm dinheiro»; «comprai trigo para comer sem pagar nada; levai vinho e leite, que é de graça». Estou a citar Isaías 55, 1-2. Convite gratificante para tempo em que o calor aperta e as pessoas debandam para as praias em busca de água que refresque as sedes e descanse os cansaços. Convite que contrasta com outros convites e ofertas sedutoras, mas que esmagam as contas bancárias já em si mesmas esmagadas. Convite que não coloca problemas económicos nem agrava a crise actual. É convite para nascentes de água ainda por contaminar; é convite para alimento que o dinheiro não alimenta nem sacia. Convite, afinal, para matar a sede das origens de nós próprios. Águas de nascente para a «nascente» da vida onde as nossas sedes e cansaços se podem verdadeiramente dessedentar.

Cristo espera-nos em tempo de férias. Não faltam pubs, boites e restaurantes com anúncios luminosos convidando a bons petiscos e pratos regionais à mistura com bebidas requintadas e exóticas. Em contraste, por vezes mesmo ao lado, uma igreja modesta, talvez uma capelinha envergonhada, mas de portas abertas, albergando frescura, silêncio e paz, esconde a Casa de Deus onde o Senhor nos espera com o seu convite: «Quem tem sede, venha a Mim e beba»! Entremos, porque lá corre normalmente brisa refrescante e sombra reconfortante. «Descansai um pouco», diz o Senhor aos seus discípulos. E se, entretanto, acontecer alguma Eucaristia, aproveitemos também o momento para matar as nossas fomes com o Pão da Vida que Ele diz e quer ser. Não nos arrependeremos, garanto.

Nota: Este ano, o mês de Julho abre com a Festa/Solenidade do Sagrado Coração de Jesus. O pensamento leva-me para o Calvário onde Jesus morre com sede («Tenho sede!» – João 19, 28), precisamente à mesma hora de calor em que anos antes O encontrámos sentado e cansado junto ao Poço de Jacob, com fome e sede. Da fome foram tratar os seus discípulos à aldeia mais próxima; da sede tratará a Samaritana que vem a caminho, também ela cheia de sede, outra sede. Duas sedes que se matam reciprocamente com duas águas. Dá-Me da tua água que Eu te darei da minha, pede-lhe o Senhor. No Calvário, uma lança deixa-Lhe o Coração aberto e a brotar «sangue e água» (João 19, 34), qual fonte de Água Viva onde podemos matar as nossas sedes, neste tempo de sede e calor. Assim o queiramos. Boas Férias

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