Lc 18, 11 Meu Deus eu te dou graças por não ser como os outros homens"
Em matéria de julgamentos, a experiência mostra que é
preciso muita humildade (que tem a ver com a verdade e, por isso mesmo, precisa
ser procurada!). Por um lado, há o riso de exagerar as qualidades daquilo que é
dos outros: “a galinha da vizinha é melhor que a minha”, “o que vem de fora é
que é bom”, ou até se elogiam “os maridos da outras” como bem cantado foi por
Miguel Araújo. Por outro, há o perigo (de que o fariseu deste evangelho é
exemplo) de exagerar virtudes próprias, construíndo auréolas brilhantes,
espalhando imagem e “glamour” salpicada de água benta, para se colocar em
pedestais, bem acima dos outros, num mundo à parte. E quando toca a misturar a
tentação de julgar os outros com a presunção de “defender Deus e a santa
religião” o equívoco pode ser ainda maior.
Grande escândalo o de Jesus, em apresentar como modelos da
vida da graça as prostitutas, os publicanos, os samaritanos e até as crianças!
Que exemplos de ordem e de lei podemos apresentar aos mais novos? Como
respeitarão um Deus que parece não castigar os infratores nem recompensar os
cumpridores (sabe Deus o esforço de “não ser como os outros”!)? Esta surpresa
do Pai que Jesus revela nunca se esgotará para nós. Porque não é a “rama”,
aquilo que somos exteriormente, que importa. O que é mesmo importante é o que
somos por dentro, é o fundo de nós mesmos onde olhamos Deus face a face ou nos
olhamos simplesmente ao espelho. É aí que pode haver encontro que liberta e
salva ou auto-justificação que nos fecha ainda mais numa redoma. Na parábola do
fariseu e do publicano, mais do que os actos bons ou menos bons, religiosos ou
não, o que importa é o interior de cada um. O fariseu veio apresentar os seus
créditos e esperar a recompensa, tratou Deus como um patrão e ficou na mesma; o
publicano veio de mãos vazias, tratou Deus como alguém que se ama, pediu
perdão, e regressou com caminhos novos para percorrer.
Quando Deus se revela mais salvador do que castigador o medo
é vencido pela esperança, e a aparência pela verdade. Ficam no desemprego os
especialistas em julgar a parte pelo todo, e os “diáconos Remédios” da
moralidade (que pena ter ficado associado a esta genial caricatura um grau do
sacramento da Ordem tão belo e cujo nome significa “servidor”). Jesus não teve
problemas em ser identificado com os “outros”, “Nazareno”, e até chamado
“comilão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores” (Lc 7, 34).
Porque Ele é o “Deus connosco” e nada do que somos O escandaliza. Jesus sabe
bem que, no fundo, somos filhos amados de Deus. E tudo o que impede essa
descoberta é que é importante fazer desaparecer!
P. Vítor Gonçalves
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